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O Novo de Nós – Para Onde Ir?

“A verdadeira viagem de descoberta não consiste em buscar novas paisagens, mas em ter novos olhos”
(Marcel Proust)

Cada homem tem em si um continente de caráter a ser descoberto.
Feliz aquele que age como Colombo de sua própria alma.
(J. Stephen)

Escrevo sobre as coisas que ocupam minha mente e sobre as quais eu mesma estou refletindo. Em texto anterior fiz a seguinte afirmação: “Uma das coisas que nos trava a mudança é o receio de como nos constituiremos como pessoa, sem as coisas que ocuparam tanto nosso tempo, até então. Às vezes, estamos tão identificados com dadas situações e elas delineiam de tal modo nossa identidade, que parece que não conseguiremos nos reconhecer se abrirmos mão das mesmas”. Afirmei que esse receio é resultado de orbitar em ilusão, pois somos muito mais do que fazemos, das relações que temos, das coisas que adquirimos… enfim, nada disso nos define. Creio que, de fato, esse é um tema que merece uma cuidadosa reflexão: A nossa identidade como pessoa, para além de todos os papeis que representamos, as coisas que possuímos, as relações que entabulamos. O que é essencial no que queremos nos constituir neste tempo?

Pensando sobre a constituição desse “novo de nós”, me recordei dos dois pensamentos que menciono acima: “A verdadeira viagem de descoberta não consiste em buscar novas paisagens, mas em ter novos olhos” (Marcel Proust) e “Cada homem tem em si um continente de caráter a ser descoberto. Feliz aquele que age como Colombo de sua própria alma”. (J. Stephen)
Recordo-me de uma conversa que tive com um amigo, paraquedista, alguns anos atrás. Ele partilhou algo de sua experiência, que passou a ser para mim, como uma metáfora para a vida. Conversávamos sobre os receios que vivenciamos em dadas situações onde ponderamos a possibilidade de tomar algumas decisões, correr alguns riscos, mas que tememos, pelo simples fato de não termos previamente clara previsão da repercussão de tais decisões em nossas vidas. É mesmo complexo e difícil. Não temos bola de cristal e o futuro é uma incógnita.

O meu senso prático – eventualmente sou muito pragmática, ou seja: sim, sim não, não – já foi logo contrapondo duas opções, se o medo é maior que a vontade arriscar, não faça nada. Desista. Se a vontade de arriscar é maior que o medo, decida e haja. Parece simples, mas não é.  Então, meu amigo partilhou o seguinte: “Às vezes eu sinto muito medo, muito medo mesmo. No entanto, eu me recordo que a primeira vez que saltei de paraquedas, eu o fiz por curiosidade, empolgação, tudo era novo e me mobilizou enormemente. A segunda vez eu tive medo, pavor, porque tinha exata noção do perigo, do tamanho do risco, foi muito difícil, mas saltei. Depois disso me apaixonei e me sinto muito bem em saltar. Quando sinto medo, me recordo disso. Talvez, a grande questão seja o segundo salto, que é muito difícil de dar, mas e se depois dele for como a experiência que vivi? E se a partir da decisão tomada puder vivenciar preciosos momentos em minha vida? Então, não é fácil simplesmente decidir não dar o segundo salto por temer. A questão é que é preciso ponderar que posso perder a oportunidade de viver o terceiro’, o quarto, o quinto e muitos outros momentos de algo que me faz muito bem, porque não dei o segundo salto.”

Excelente. Metáfora perfeita para nossa vida. Jamais vou esquecer a ponderação de meu amigo sobre suas escolhas.

Fiquei pensando… No caso de saltar de paraquedas, a questão não é simplesmente saltar. É preciso ter noções sobre como saltar, exercitar-se em território seguro, preparando-se para a experiência, ter os equipamentos adequados, testar os equipamentos, adquirindo gradual segurança sobre o funcionamento dos mesmos. Enfim, há uma série de ações preparatórias que podem gradualmente fortalecer e dar clareza sobre o tamanho dos riscos e se terá condições de superá-los, para pôr fim saltar efetivamente. O salto não é só o momento final, é também o processo. O salto vai amadurecendo dentro de você até que tenha a coragem de efetiva-lo ou decida que realmente não deve fazê-lo.  Ou seja, de alguma forma, existe uma preparação, e ela traz consigo a exata dimensão dos riscos que se corre.

Mas, ao que eu relacionaria, na metáfora, o primeiro salto? Eu relaciono o primeiro salto ao encanto, a empolgação, a mobilização pela mudança do olhar. Creio que o primeiro salto é para dentro de nós mesmos, para a compreensão daquilo que faz nosso coração vibrar… Recordo-me aqui o que afirma Osho, que por sinal é uma sugestão corajosa: “Sempre que houver alternativas, tenha cuidado. Não opte pelo conveniente, pelo confortável, pelo respeitável, pelo socialmente aceitável, pelo honroso. Opte pelo que faz o seu coração vibrar. Opte pelo que gostaria de fazer, apesar de todas as consequências”. É preciso saber o que quer o coração.

Talvez, a clareza sobre “o novo de nós”, sobre a constituição de uma identidade mais realizadora, não exista desde o início de nossa percepção da necessidade de mudar, desistir de um caminho ou romper. Talvez, tenhamos de tatear nosso coração, para descobrir seus contornos, com os quais desconectamos pelas muitas distrações. Esse é um salto que exige coragem… considerando que a maior das coragens é a coragem de nos enfrentarmos.

E o segundo salto? O segundo salto eu relacionei ao seguinte:   a gente até dimensiona os riscos, mas nos constituir autenticamente, de modo diverso, em cada tempo que vivemos, envolve um percurso que precisamos corajosamente percorrer. Creio que o segundo salto envolverá a coragem do navegador, que enfrenta o percurso dos mares desconhecidos com bravura, tendo como bússola o vislumbre do destino que deseja em seu coração. É possível e feliz ser Colombo da própria vida.

Enfim, estou pensando sobre isso…

Christina Rocha

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