Recriação

Somos o somatório de nossas escolhas. Cada dia a vida nos apresenta inúmeras possibilidades. Uma pequena escolha nos abre ou fecha portas, de modo que pode determinar os rumos de toda uma vida. Não podemos prever as conseqüências das decisões que tomamos, mas é bom sabermos que sempre têm repercussão presente e futura.

Se estivermos insatisfeitos com o que temos feito de nós, cabe a nós mesmos nos reconstruir. Se estivermos infelizes, cabe a nós constituirmos novos rumos para o que somos e para o modo como agimos.

Quando somos vítimas de nossas impossibilidades estamos agindo de um modo covarde perante a vida.

Recordo-me da musica, aquela: “eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim…” Gabriela!!! Isso parece uma novela. Tem pessoas que parecem novelas de crises, insatisfações, inconstâncias, indefinições, falta de foco, falta de rumo, falta de clareza do que sentem, pensam e querem para si. O que buscam nunca as satisfaz, porque as necessidades que sentem são existenciais. Nada do que temos de fato nos constitui. Nossos tesouros habitam nossas almas.

Algumas pessoas passarão a vida pobres em realizações, porque são omissas frente a seus próprios desafios, projetando externamente as culpas e justificativas para suas ações. Discurso e prática desconectados, palavras jogadas ao vento. Busca-se substância, conteúdo, e encontra-se um imenso vazio. Pessoas que não se recriam, que não se reinventam, pessoas que não assumem o desafio de sua própria invenção. Vítimas do passado, fracas, impotentes, não conseguem, também, construir um presente mais realizador. Não souberam romper, não souberam soltar as algemas, perpetuam as ancoras repetindo para si mesmas os mesmos discursos, medíocres ilusões que justificam a perpetuação dos mesmos comportamentos.
Com certeza, não quero ser assim. É um desafio ser diversa. Nossos maiores desafios e realizações não são concretos. Pertencem ao âmago de nosso ser, estão relacionados à nossa razão para viver.

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Critérios e Decisão

Em alguns momentos me pego pensando como devo interpretar comportamentos e acontecimentos a minha volta: De que modo perceber as intenções ou os silêncios? Como conectar palavras e ações? Que parâmetros usar para tomar minhas próprias decisões a partir do que percebo realidade?

Teoricamente sei que não existe realidade como uma coisa em si, que possa ser lida e interpretada de uma única maneira. Toda situação, contexto, pode ser lido e interpretado de múltiplas formas. Nossas lentes – ideológicas, psicológicas, vivenciais, culturais – constituem nossa possibilidade de perceber e significar os mundos a nossa volta.

Se não bastasse a amplitude e complexidade de tal condição, há alguns sérios equívocos que se dão em nossas relações, por dificuldade de comunicação. Quanto mais vazios deixamos na comunicação, mais possibilitamos espaços para ruídos – deduções, às vezes equivocadas. Meu interlocutor, só vendo a partir das possibilidades que tem, preenche o vazio de informações que deixei a partir do que lhe parece ser possível.

Isso quer dizer que quanto mais, de modo claro, preciso, objetivo, falo de meus sentimentos, desejos, intenções e demonstro isso concretamente em minhas ações, mais possibilidades tenho de ser mais bem entendida. Quanto mais silencio, fico ensimesmada, distante, isolada, ou mesmo ocupada com minhas próprias coisas, sem atentar para as relações que constituo, mais vazios de comunicação acontecem, o que pode resultar em entendimentos equivocados e distantes de minha real intenção.

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Trouxeste a Chave?

Fui provocada a refletir. Imaginem o diálogo:

— Chris, para que essa chave no seu chaveiro?
— Uai, não sei não.
— E por que você carrega uma chave que não sabe para que serve?
— Para abrir uma porta que não sei onde está.
— Isso não faz sentido.

Fiquei pensando:
Faz sim. Metaforicamente, sempre levamos conosco algumas chaves que não sabemos nem como, nem quando vamos usá-las, porque desconhecemos onde estão as portas que tais chaves podem abrir. Em nossa vida há sempre portas de entrada e de saída, que por algum motivo perdemos a localização, ou não identificamos como tal.

Drummond disse em seu belíssimo poema “Procura da Poesia”:

“Penetra surdamente no reino das palavras.
(…)Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?”

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Ser ou Nada

Há á momentos que revisamos uma série de coisas e pensamos sobremaneira sobre nossos porquês.

Porque uma escolha e não outra, porque uma dor e não outra, porque um lugar e não outro, porque um trabalho e não outro, porque uma pessoa e não outra. O “se fosse de outro modo” não existe como uma possibilidade relativa às escolhas passadas. Revisitar uma serie de coisas tem mais a ver com uma tentativa de entender nossas motivações e condicionamentos, para tornar o presente mais consciente e menos dominado por comportamentos que nos fazem mal, mas sobre os quais temos pouco controle ou decisão.

Contatar nossas sombras, contatar comportamentos inadequados que precisamos superar, é algo que exige coragem.

Com certeza, precisamos riscar do mapa de nossas vidas coisas que nos fazem mal. Às vezes toleramos demais – essa é bem a palavra: tolerar – coisas que nos fazem sentir muita raiva, por querer contemporizar, considerar, valorizar outras, minimizando os efeitos que as coisas que toleramos têm sobre nossas emoções. Lá pelas tantas, nos damos  conta que somadas às tolerâncias, toleremos tempo demais, coisas demais, em nome de caminhar outra milha, dar outra chance, perdoar e compreender, relevar, buscar entender as limitações próprias da natureza humana. Tudo que toleramos demais nos envenena.

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Relações

Toda relação humana é um processo muito interessante de aprendizagem recíproca. Jamais, em minha trajetória, vi relações humanas desprovidas de conflito, de aprendizagens, de necessidade de compreensão mútua, de desafios a serem superados e expectativas reconstruídas. Jamais vi, seja com relação a famílias, casais, filhos, namorados ou amigos, algo que pudesse parecer com um “ideal”  de harmonia, reciprocidade, respeito, consideração, cumplicidade, sem que isso se constituísse também em meio a inquietações, estranhezas, dúvidas, mal-entendidos.

Sempre vi exercícios de existir, mistos de alegrias e tristezas, encontros e desencontros, aproximações e distanciamentos. As pessoas que conheci, que demonstram felicidade, entendem a relação como algo assim: desafio e possibilidade. Algo que se gesta, em meio a momentos de caos, de dúvida, mas também de teimosia e desejo de superações.

Nossos desencontros, muitas vezes são projetados como desencontros de um outro com o qual nos relacionamos. Mas a maioria das vezes nossos desencontros são  reflexos de nossos próprios conflitos e dificuldades relacionais. Algumas vezes somos inseguros com relação às nossas próprias possibilidades de amar. Se nos deixarmos ser prisioneiros de nossos próprios muros, não conseguimos constituir uma relação satisfatória. Se tivermos medo de amar, medo de falar sobre nosso amor, medo de apostar em aproximações, de sermos invadidos, medo da fragilidade e se fugimos, nos distanciamos e nos perdemos do encontro com um outro com quem poderíamos constituir algo belo e significativo. É comum que as pessoas subestimem os momentos felizes enquanto as dores são superestimadas. Valoriza-se demais a dor, enquanto os sorrisos e alegrias são esquecidos.

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O Que Não Se Pode Perder? 

Aventurar-se causa ansiedade, mas deixar de arriscar-se é perder a si mesmo.

Aventurar-se no sentido mais amplo é precisamente tomar consciência de si próprio”.
Soren Kierkegaard

Depois de uma semana intensa de trabalho, voltei para casa. Após seis horas de viagem, esperava por minha mala no aeroporto, pensando no descanso e no quanto era bom estar de volta, após a missão cumprida. Esperei… esperei… até constatar que a mala havia desaparecido.

Fui solicitar providências e preencher boletim narrando o ocorrido. Transtornada com a situação, me deparei com a absoluta impossibilidade de fazer algo a respeito, a não ser esperar que a companhia aérea tomasse as providências de tentativa de localização da mala desaparecida. Fui relembrando o que estava dentro da mala e pensando a falta que faria, avaliando o que significaria a não localização da mesma. Eu me recordei de todas as anotações que fiz, em meu trabalho, e que não tive tempo de passar para o computador.  Para aliviar o peso da bagagem de mão, passei o material para a mala que despachei. Que infelicidade!  Aborrecida, após pedir todas as explicações possíveis, me acalmei com o seguinte pensamento: A mala não chegou, mas eu cheguei, a mala está perdida, mas eu não me perdi. Isso me auxiliou a dar à devida proporção a perda e reorganizar as minhas emoções. Fui pra casa, sem mala, descansar.

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Riscos

Talvez um dos nossos maiores desafios seja decidir que rumos dar à nossa própria vida. Seria fácil se fossemos algo — um ser que em processo de evolução e amadurecimento…

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Fazer Amor Com a Própria Alma

O hoje é apenas um furo no futuro Por onde o passado começa a jorrar
E eu aqui isolado onde nada é perdoado Vi o fim chamando o princípio pra poderem se encontrar”
(Banquete de Lixo – Raul Seixas)

 

Uma das coisas que me fascinam em conversar com as pessoas – como um desafio a compreensão –  é que suas palavras, expressões e pensamentos são sempre muito mais do que o que parece fazer sentido para mim, que as ouço, e com elas interajo. As suas palavras, pausas e silêncios, às vezes, são manifestação do transbordamento de uma conversa paralela interior, não explicita. Há sentidos e significados que escapam do que está presente no discurso – subjazem a aparente linearidade do que é dito.

Explico melhor. Outro dia conversava com uma pessoa, até então pouco conhecida para mim, quando repentinamente, sem um aparente sentido no contexto do que falávamos, ela exclama: “O hoje é apenas um furo no futuro por onde o passado começa a jorrar”. Anotei a frase. Fui pesquisar e descobri que pertence a música Banquete de Lixo, de Raul Seixas, que por sinal é complementada por outra, muito interessante: “Vi o fim chamando o princípio pra poderem se encontrar”. Na hora que a frase foi dita perguntei: “- De onde tirou essa frase?” Ela me respondeu: “Não sei, apenas veio a minha mente.” Porque lhe veio à mente será para mim eternamente uma incógnita. Era o mundo interior de meu interlocutor que fervilhava e gestou, em meio a suas reflexões silenciosas, um transbordamento. Tudo é sempre muito mais.
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