Concordo que “buscar a felicidade” é uma expressão bastante inadequada. Não creio que exista a possibilidade de “buscar a felicidade” como uma meta a ser alcançada depois. Depois, não existe. Existe a vida como acontecimento, agora. A vida é agora, sem adiamentos.
Isso me faz lembra uma letra de música:
“Só uma coisa me entristece
O beijo de amor que não roubei
A jura secreta que não fiz
A briga de amor que não causei
Nada do que posso me alucina
Tanto quanto o que não fiz
Nada do que eu quero me suprime
De que por não saber ainda não quis
Só uma palavra me devora
Aquela que meu coração não diz
Só o que me cega, o que me faz infeliz
É o brilho do olhar que não sofri
Só uma palavra me devora
Aquela que meu coração não diz
Só o que me cega, o que me faz infeliz
É o brilho do olhar que não sofri.”
Todos nós passamos rápido demais. Não existe o passado, só o passado rememorado no presente. Não existe futuro, apenas o desejo de futuro no presente. Se viver de memórias, ou viver de desejo, eu estou escolhendo viver de passado ou de futuro, no presente. A lembrança e o desejo podem ser uma distração, uma divagação, enquanto o presente passa sem assimilação. Parece complexo?
Não gosto que seja complexo, porque gosto de simplicidade e de nada me valem as palavras se não me fizerem sentido e não me ajudarem a viver. Quero me traduzir:
Se sinto sede, e bebo uma água gelada, é importante que eu esteja ali, que esteja presente, sorvendo a água, sentindo sua temperatura, percebendo como essa água interage com meu corpo, satisfazendo minha sede. Mas, quantas vezes bebemos água sem nem lembrar que é isso que estamos a fazer? Talvez, se estivéssemos num deserto imenso, num calor insuportável, caminhando peregrinos, nos daríamos conta do imenso prazer de um gole de água fresquinha. Mas, cotidianamente nos distraímos desse prazer. Desse e de muitos outros. Nós nos perdemos em elucubrações, com lembranças de um passado que nos marcou, ou de um futuro desejado, e perdemos o prazer de um momento singular, o único enfim, que de fato existe e nos pertence. A felicidade não me parece um estado que possamos buscar, se não, uma realidade que estejamos ou não a viver.
Pensando em pessoas que vivem de adiamentos, que vivem deixando para depois… – a viagem para depois, o projeto para depois, o descanso para depois, a realização para depois, o encontro para depois, o abraço para depois, a palavra que se quer falar para depois – recordo-me de um ditado das bandas do sul: “cavalo encilhado só passa uma vez”, que se refere a importância de aproveitarmos as oportunidades. Às vezes perdemos oportunidades, não alinhamos desejo e realização, porque ficamos elucubrando impossibilidades e cultivando temores. Sofremos de “e se”..- E se não der certo… e se acontecer tal e tal coisa? Mas, “e se” não existe. Eles são os disfarces, as desculpas do medo. Os temores nos engessam. Os temores inviabilizam a felicidade. É preciso ter coragem para ser feliz.
Não existe a possibilidade da felicidade se eu não estiver presente em minha vida. Se eu não estiver escolhendo viver o que vivo, sentir o que sinto, fazer o que faço, estar onde estou, realizar o que desejo.
Pois bem…, voltando a música que me recordei, então melhor é roubar o beijo de amor, fazer a jura secreta, dizer a palavra, o querer, sofrer o brilho no olhar, correr o risco e viver. Não há segurança em viver. Viver é risco, no agora. Ser feliz é viver, aqui e agora, com sentido e significado, aquele que eu quero dar a minha própria vida.
Parece-me que o grande desafio é a gente contatar o coração, é conseguir se ouvir…, é vencer o medo e ter coragem de estar presente na própria vida, assumindo conscientemente a responsabilidade pelo próprio destino.
Enfim, estou aqui, pensando e agindo, o meu.